quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Encontrando Júlia

      Cirila estava com sua irmã, as duas pelo caminho de terra da roça de Chiquinho Galheiro, sedentas para chegar em casa. O sol já estava alto, não que fosse um problema para as jovens, pelo contrário. Era sinal de que o almoço já estaria na mesa quando chegassem, seus noivos sentados na mesa comprida de madeira velha e desgastada de cupim. Ninguém saberia de quem estou falando se eu contasse uma história sobre Cirila. Seu nome era desconhecido por motivos que só quem mora em uma cidade pequena conseguiria entender. Dude, Cirila de RG, pisou em falso e fez um silêncio de medo, daqueles que se seguram no ar para recuperar o equilíbrio. Foi aí que pode escutar um choro vindo do seu ouvido direito. Pediu pra irmã se aquietar e escutar aquilo junto com ela. Eram duas crianças. Uma gritava, outra chorava e algum animal fazia um som aterrorizante, quase como se fosse um filme de terror daqueles que sua bisneta iria sentir tanto medo de ver. 
       As duas desviaram o caminho e ordenaram suas barrigas falantes a calarem a boca do estômago, até que encontraram uma casinha de barro em estado terminal, com o telhado malfeito. Os sons vinham dos fundos do lugar, mas a boa educação dada pela mãe das moças não as deixou invadir a casa sem antes chamar pelo dono, quiçá dona, dela. Ninguém respondeu aos ôs-de-casa, e as duas correram para acudir as crianças, a etiqueta e a classe jogadas para cima.
       No quintal da propriedade, uma garotinha de mais ou menos quatro anos chorava e gritava pela mãe enquanto andava de um lado para o outro, tentando se aproximar da irmã. Esta, pobrezinha, era arrastada pelo braço por um porco selvagem preto, e já estava suja de lama de chiqueiro e de mato e de baba de porco e de sangue e de toda a imundície. 
       Dude afugentou o animal e tomou a criança nos braços. Ela não parou de chorar milagrosamente ao se aconchegar no colo, como seria de se esperar desses filmes que fazem madame da capital ficar emocionada. Ora, pois, a pequena tava toda estraçalhada por causa do bicho sem alma, aquele espírito de porco! Dude foi limpando aquela coisa miúda e magrela, que nem devia ter chegado aos sete meses de idade, e percebeu que ela tinha a mesma cor da lama que a cobria. Preta igual fundo de rio na cheia. Linda.
      Atrás dela, a irmã fazia cafuné nos cabelos da menina mais velha, e apontou para o horizonte. Uma mulher negra e magra vinha andando na direção da casa, com um sombreiro de palha furado na cabeça. Ela chegou até o cenário principal da história e tomou conhecimento do que tinha acontecido. Era a mãe das meninas. Até então.

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